"EU SOU O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA" JESUS

"... a sabialidade não está naquilo que se faz, está naquilo que você sente em fazer." Dr. Claudionor de Carvalho

sábado, 1 de outubro de 2011

A lágrima do Codificador




Há um século



     Allan Kardec, o Codificador da Doutrina Espírita, naquela triste manhã de abril de 1860, estava exausto, acabrunhado.     Fazia frio.     Muito embora a consolidação da Sociedade Espírita de Paris e a promissora venda de livros, escasseava o dinheiro para a obra gigantesca que os Espíritos Superiores lhe haviam colocado nas mãos.     A pressão aumentava...     Missivas sarcásticas avolumavam-se à mesa.     Quando mais desalentado se mostrava, chega a paciente esposa, Madame Rivail – a doce Gaby –, a entregar-lhe certa encomenda, cuidadosamente apresentada.     O professor abriu o embrulho, encontrando uma carta singela. E leu:     “Sr. Allan Kardec:     Respeitoso abraço.     Com a minha gratidão, remeto-lhe o livro anexo, bem como a sua história, rogando-lhe, antes de tudo, prosseguir em suas tarefas de esclarecimento da Humanidade, pois tenho fortes razões para isso.     Sou encadernador desde a meninice, trabalhando em grande casa desta capital.     Há cerca de dois anos casei-me com aquela que se revelou minha companheira ideal. Nossa vida corria normalmente e tudo era alegria e esperança, quando, no início deste ano, de modo inesperado, minha Antoinette partiu desta vida, levada por sorrateira moléstia.     Meu desespero foi indescritível e julguei-me condenado ao desamparo extremo.     Sem confiança em Deus, sentindo as necessidades do homem do mundo e vivendo com as dúvidas aflitivas de nosso século, resolvera seguir o caminho de tantos outros, ante a fatalidade...     A prova da separação vencera-me, e eu não passava, agora, de trapo humano.     Faltava ao trabalho e meu chefe, reto e ríspido, ameaçava-me com a dispensa.     Minhas forças fugiam.     Namorara diversas vezes o Sena e acabei planeando o suicídio. “Seria fácil, não sei nadar” – pensava.     Sucediam-se noites de insônia e dias de angústia. Em madrugada fria, quando as preocupações e o desânimo me dominaram mais fortemente, busquei a Ponte Marie.     Olhei em torno, contemplando a corrente... E, ao fixar a mão direita para atirar-me, toquei um objeto algo molhado que se deslocou da amurada, caindo-me aos pés.     Surpreendido, distingui um livro que o orvalho umedecera.     Tomei o volume nas mãos e, procurando a luz mortiça de poste vizinho, pude ler, logo no frontispício, entre irritado e curioso:     “Esta obra salvou-me a vida. Leia-a com atenção e tenha bom proveito. – A. Laurent.”     Estupefato, li a obra O Livro dos Espíritos, ao qual acrescentei breve mensagem, volume esse que passo às suas mãos abnegadas, autorizando o distinto amigo a fazer dele o que lhe aprouver.”     Ainda constavam da mensagem agradecimentos finais, a assinatura, a data e o endereço do remetente.     O Codificador desempacotou, então, um exemplar de O Livro dos Espíritos ricamente encadernado, em cuja capa viu as iniciais do seu pseudônimo e na página do frontispício, levemente manchada, leu com emoção não somente a observação a que o missivista se referira, mas também outra, em letra firme:     “Salvou-me também. Deus abençoe as almas que cooperaram em sua publicação. – Joseph Perrier.”     Após a leitura da carta providencial, o Professor Rivail experimentou nova luz a banhá-lo por dentro...     Conchegando o livro ao peito, raciocinava, não mais em termos de desânimo ou sofrimento, mas sim na pauta de radiosa esperança.     Era preciso continuar, desculpar as injúrias, abraçar o sacrifício e desconhecer as pedradas...     Diante de seu Espírito turbilhonava o mundo necessitado de renovação e consolo.     Allan Kardec levantou-se da velha poltrona, abriu a janela à sua frente, contemplando a via pública, onde passavam operários e mulheres do povo, crianças e velhinhos...     O notável obreiro da Grande Revelação respirou a longos haustos e, antes de retomar a caneta para o serviço costumeiro, levou o lenço aos olhos e limpou uma lágrima...Hilário Silva

Retirado de o livro "O Espírito da Verdade", Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira, Cap. XXV – Item 2.

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